sábado, 10 de fevereiro de 2018

sexta-feira, 21 de julho de 2017

sexta-feira, 11 de março de 2016

Por uma Rosa que partiu...

Álvaro de Campos

Com as malas feitas e tudo a bordo

Com as malas feitas e tudo a bordo
E nada mais a esperar da terra que deixamos,
Já com os trajes moles característicos dos viajantes, debruçados da amurada
Digamos adeus com um levantar da alegria ao que fica,
Adeus às afeições, e aos pensamentos domésticos, e às lareiras, e aos irmãos,
E enquanto se abre o espaço entre o navio lento e o cais
Gozemos uma grande esperança indefinida e arrepiada,
Uma trémula sensação de futuro.
Eis-nos a caminho, e quase a meio do rio
Aumenta a nitidez deixada na terra
Dos alpendres e dos guindastes ou das mercadorias descarregadas
E não é a nós, felizmente, que diz adeus aquela família
Aglomerada no extremo do cais, com um cuidado subjectivo e visível
De não cair dentro de água no meio da emoção.
Olhemos para os companheiros de bordo. Como são diversos!
Uns vão em trânsito. Não é com eles nenhuma destas despedidas.
Outros, com um ar palidamente sorridente de não querer chorar,
Acenam com um gesto deselegante e pouco afoito com os lenços
Para lenços que se acenam de outra gente que ficou no cais
No cais — ah reparem — subitamente tão mais longe do que notámos.
A amargura alegre da ida,
O sabor especial a começo de viagem marítima, a mistura com nossos sentidos
De cheiro das malas, de cheiro a navio, de cheiro a comida de bordo,
E a nossa alma é um composto confuso de cheiros e sabores
E tudo é a viagem indefinida que faremos vista através do paladar e do olfacto,
Tudo é a incerteza sensual da vida sentida pela espinha abaixo...
E nós não deixamos ninguém...
Se deixássemos, ah os lenços que lindos!, o navio que se afasta
Afastar-se-ia de mais do que da terra;
Afastava-se do nosso passado todo, de nós-mesmos, ficados no cais e aqui a caminho,
Do sentimento doméstico com que beijamos a nossa mãe,
Da alegria com que às vezes, brincando, arreliamos as nossas irmãs...
Partir! partir é viver excessivamente. O que é tudo senão partir...
Todos os dias do cais da nossa vida nos separamos, navios (...),
E vamos para o futuro como se fossemos para o Mistério,
Mas que sabemos nós para onde vamos, ó dor, e o que somos,
E que proteico e fluido Deus é tutelar das partidas?
Olha, de longe, já os guindastes ainda mexendo,
Olha as figuras no cais, negras figuras, manchadas de lenços que se acenam,
Olha os casarões de zinco ondulado dos cais e docas, às portas deles,
O sossego destacado e acostumado a isto dos empregados e dos carregadores...
Vai tal angústia, tão inexplicável angústia na minha alma,
Que não sei como têm coragem, vendo que eu grito assim, para estarem parados
No cais, tranquilamente os descarregadores e os guardas fiscais!
Bebedeira da vida... ligeiro nervoso nas nossas sensações...
Perturbação alcoólica dos nossos sentidos íntimos...
A nossa alma sai um pouco para fora do seu lugar
E as rodas da nossa vida quotidiana começam a cambalear como se fossem sair do eixo...
Pelo convés fora a gente que já está acostumada a estar aqui a bordo
Está alheia a isto e interessada contudo
(Ah [enquanto eu atirar meu directo olhar, nunca?] olhar tranquilo,
Fremem em mim os nervos vibrados de todos que vejo que sentem,
Correm-me dos olhos as lágrimas de todos que choram porque se separam,
Tenho nas mãos os gestos circulares de mãos saudosas já que acenam com lenços,
Sou todas as penas que toda esta gente tem de se ir embora...
Sou as esperanças que levam consigo e agora lhes fazem mais trémula a dor da partida,
Estou [...] por dentro deles todos, na roupa que compraram para a viagem,
Nos pequenos objectos que, na véspera («Lá me ia esquecendo» dizem, e era uma coisa inútil)
Compraram de noite numa loja feérica cheia de malas de couro e que ia fechar...
Ah, com todos os nervos de toda a gente, os meus nervos vibram...
E com os estremeções das máquinas do navio, e com o estralejar da bandeira ao vento
E com o túmido tremor das enxárcias e com o ondular dos toldos
E toda a minha alma é uma dolorosa vibração física em ritmos de mim).
Vida cosmopolita atirada aos quatro ventos...
Vida de tanta gente real a bordo de tantos navios...
Embriaguez de lidar com outra gente e saber que eles existem e têm vidas passadas, preparadas, gozadas,
Sofridas, e tão curioso o traje, interessante a moral, de cada pessoa,
E tão cheio de enigmas e de metafísicas o modo como falam, como riem, como arranjam o cabelo, como se entendem uns com os outros...
Sensação metafísica das outras pessoas e das suas realidades, e do seu décor...
Ó doença humanitária dos meus nervos vibrando cheios de outras pessoas,
Volúpia de gozar e sofrer através de hipóteses dos outros...
E eu ser só eu, só eu eternamente, e não ter outras vidas senão a minha!
Como se tocassem o fado de repente à meia-noite numa aldeia na América do Norte,
Um fatalismo metafísico com os nervos de toda a gente vibra em mim a cada momento
Quando reparo cosmopoliticamente nos outros, e ouço várias línguas
E vejo nos gestos e nos trajes — que parecem idênticos mas são tão diferentes — várias pátrias, vários costumes,
E entrevejo lares diversos, vidas comerciais complexas, amores desconhecidos, mas de cidades que desconheço,
Tudo como num animatógrafo num teatro do tamanho do Universo,
Onde se soubesse que acabava o mundo e saindo para fora,
Não há casa para onde se regresse, nem automóvel que nos leve para um lugar qualquer,
Mas a Noite Absoluta, e Deus talvez como uma Lua Enorme significando
IV
Profunda e religiosa solidão do indefinido Universo,
Vastidão enorme, nem larga nem alta nem comprida, mas só espaço, o constelado espaço
Deste mistério azul-negro e estrelado onde a terra é uma coisa
E as vidas aparecem como lanchas à superfície da água...
Raios de sol entrando pela janela entreaberta no quarto da casa de campo,
Meios-dias nas eiras abandonadas,
Tardes noites para encontros em outras margens de rios,
Fazei do nosso conseguimento natural um sossego, uma capa
E descei sobre a minha alma...
Vós, ó campos repousados e incivilizados
Vós ó rios tranquilamente passando por uma inquietação,
Vós ó jardins públicos às tardes visitados
Vós ó tanques de quintas, vós ó lareiras em solares,
E disperso arfar de sedas pretas o silêncio da noite.
s.d.
Álvaro de Campos - Livro de Versos . Fernando Pessoa. (Edição crítica. Introdução, transcrição, organização e notas de Teresa Rita Lopes.) Lisboa: Estampa, 1993. 
 - 29.

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Albedo

05/08/2015 - 19:02

A Águia Alquímica
Após a renovação da Matéria, é necessário a “limpar” através das destilações, tal como Ireneu Filaleto utiliza na Entrada Aberta ao Palácio Fechado do Rei, de forma que o Corpo fique então totalmente purificado. Por vezes esta fase é confundida com a designada “sublimação”, pois que ainda se está na fase do Nigredo, tal como Nicholas Flamel a descreve no Livro dos Hieróglifos: “a matéria é negra e liquida […] esta água desce, reduz o mais que pode o resto dos ingredientes, até tudo ficar como que uma mistura cozida e negra. Por este motivo se denomina a este processo sublimação e volatilização, já que voa para o alto”. O processo de destilação, no simbolismo alquímico, é designado de “Águia”. Ora, ao percorrer-se a Rua Augusta e após quatro ruas a partir do Arco do Triunfo, mais especificamente na Rua de São Nicolau, encontra-se a Águia de asas abertas, como que estivesse a ascender ou a voar de uma labareda que se encontra por baixo dela. Imagem que faz lembrar de imediato duas coisas: a Fénix e a Águia alquímicas, que estão plenamente em comunhão com a segunda Etapa do Magistério, o Albedo, pois a Matéria renasceu tal como a Fénix renasce do Fogo, sendo o início da segunda fase designado de Águia.
Fonte: https://lusophia.wordpress.com/2009/07/12/opus-magnum-olisiponense-hugo-m-d-martins/
Ele disse "O meu papel é olhar para a floresta... não para a árvore!". Assim é.
OBRIGADO ao Homem da Fénix.

terça-feira, 4 de agosto de 2015

O Idiota

Há um ano num convite para um jogo de simples entre simples ouvi como resposta: "Não jogo neste campeonato" ou "O meu campeonato é outro". Fiquei surpreso... o momento e o tempo não justificavam o acervo. Alguém disse: Está sempre a trabalhar. É verdade. Nem quando deveria relaxar está relaxado. E é esse o seu castigo. A inquetude permanente que mascara com uma calma interiormente agitada que obriga à necessidade de controlo total, qual água que preenche todos os espaços.

Robert Greene tem um livro fantástico: "The 48 laws of Power".

LAW 1 page 1

NEVER OUTSHINE THE MASTER

Always make those above you feel comfortably superior. In your desire to please or impress them, do not go too far in displaying your talents or you might accomplish the opposite-inspire fear and insecurity. Make your masters appear more brilliant than they are and you will attain the heights of power.

Tentei seguir sempre a 1.ª Lei do Poder com o último parágrafo em mente.

Mas o que senti (com fundamento ou sem ele) foi "do not go too far in displaying your talents or you might accomplish the opposite-inspire fear and insecurity". Confesso que por vezes fiz, faço por "go too far" para ver a qualidade dos parceiros. Se é ou não de um campeonato superior, não tenho elementos ainda que permitam responder! Tem um poder temporal que de momento pode exercer? Sim. Mas o superior que deriva da posição e da disposição do poder é ilusório, é um jogo de sombras até surgir outro tempo ou outra luz. Inúmeros poderosos terminam sós. A verdadeira superioridade deriva das alianças, das alianças assentes em confiança. O tempo, bom conselheiro, demonstrará a fibra e caráter dos em presença.

De hoje, sem mais que permita analisar, só me fica:"In your desire to please or impress them, do not go too far in displaying your talents or you might accomplish the opposite-inspire fear and insecurity". Não sei se fiz o pecado capital de assustar (o que pela enunciação demonstra a minha arrogância sabendo que o inferno está cheio de insubstituíveis), mas se o fiz... que grande prémio recebi, de alguém que tudo recebeu. E sei que ainda tenho mais para perder... Os grandes nunca aceitam o livre pensamento. E se há coisa que cada homem nasce e que é sagrada: é o pensamento livre. Como dizê-lo nos fóruns alargado é como se infere impróprio, sei que aqui, num público mais atento, acompanhante e restrito posso dizer o que me vai na alma, tal miúdo, como o Idiota de Dostoiévski. Serei sempre um pouco como aquele Idiota de Dostoiévski... e que alegria que é sê-lo!

Façam-me um favor adicional... Be Happy!

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Epiphenomena

"Marx considered all political events as epiphenomena. He viewed great men as blind instruments of irresistible forces which they themselves could hardly comprehend."

Peter Oborne

A hard truth for those who consider themselves great men. The road leads us all to the same point. That point in eternity where we are all basic elements of the universe or it's projection. 

God's Desert - A taste of LIVE.

Live to have a sense cannot dispense God's (tastefull) Desert...